Está custando, “no mercado livre”, até R$ 70 o voto para deputado
estadual, e R$ 100 para deputado federal. O pagamento é em espécie,
dividido em parcelas, até as vésperas do dia da votação. Os “vaqueiros”,
como estão sendo chamados os outrora cabos eleitorais, não toleram
atraso nas parcelas negociadas, tanto que o mês de agosto é chamado de
período da recompra, pois naquele mês alguns contratos chegam a ser
desfeitos por descumprimento do calendário de desembolso.
As negociações são do domínio público no mundo político, mas a
cumplicidade, inclusive entre concorrentes, dificulta o trabalho da
fiscalização para comprovar a existência dos contratos. Só nos
flagrantes, no dia da votação, a compra direta nas proximidades das
seções eleitorais é comprovada, com quase nenhuma consequência para
comprador e vendedor.
O procurador-regional eleitoral cearense, Anastácio Nóbrega Tahim
Júnior, apoiado em informações publicadas pelo Diário do
Nordeste</CF>, relatando pronunciamentos de deputados na
Assembleia Legislativa cearense sobre a compra de votos, já tomou o
depoimento de dois parlamentares nesta semana.
Os depoentes não negaram o relatado pelo jornal, mas disseram não ter
provas do que afirmaram, apesar de ser voz corrente a prática do crime
para captação de votos, disseram. Eles, e tantos outros, só talvez
nominem os que lhes tomaram os votos pelo poder do dinheiro ao fim da
disputa. E se forem derrotados, portanto, nenhum procedimento judicial
os obrigará a nominar os responsáveis por essa anomalia entranhada no
processo eleitoral brasileiro.
A Justiça Eleitoral, com os seus parcos recursos investigatórios, e o
Ministério Público, idem, jamais terão condições de alcançar a todos
quantos conquistam mandatos utilizando-se de expedientes reprováveis. A
Lava-Jato está mostrando que as prestações de contas dos candidatos
aprovadas pelos tribunais, uma exigência da legislação para todos os
eleitos, não correspondem à realidade dos gastos da campanha.
Contabilizado
É a realidade do Caixa 2 nas eleições brasileiras. Em duas
oportunidades diferentes, neste ano, tratamos do tema neste espaço. Em
uma delas quando apontávamos a irrealidade que são os tetos fixados pela
legislação para os gastos de todos os candidatos no pleito deste ano,
sem impedimento de qualquer das práticas motivadoras dos gastos da
eleição no atual modelo brasileiro.
“Não existe campanha política no Brasil sem dinheiro não contabilizado,
Caixa 2. Não se faz. Se alguém disser que faz, não está falando a
verdade”, disse Mônica Moura, mulher de João Santana, responsáveis pelas
últimas campanhas do PT nacional. Não é uma afirmação à toa. Ela está
nos autos do processo em que é réu o ex-presidente Lula, no caso do
sítio de Atibaia. Ela e o marido são réus em ação criminal por lavagem
de dinheiro, exatamente por terem recebido recursos para pagamento dos
trabalhos do casal, sem o devido registro nos comitês financeiros das
campanhas respectivas.
Duda Mendonça, outro destacado marqueteiro nacional, também já fez
afirmação semelhante, agora, recentemente, em relação às eleições para o
Governo de São Paulo, em 2014, quando trabalhou para Paulo Skap, e bem
antes, no célebre processo do Mensalão, por ter recebido parte da sua
remuneração em uma das campanhas do ex-presidente Lula, em conta secreta
no exterior. Dinheiro não registrado na prestação de contas encaminhada
ao Tribunal Superior Eleitoral, e por este aprovada.
Principal
Estes são apenas exemplos de desvios em disputas majoritárias, as mais
visadas. As dos parlamentares são bem mais soltas, e consequentemente
menos fiscalizadas. É verdade, também, que somam valores bem menos
expressivos em sendo comparadas com as de prefeitos, governadores e
presidente da República.
O despudor de muitos para comprar votos inclui, além do dinheiro em
espécie, a utilização da máquina pública da União, dos estados e dos
municípios. Nestes, o caminho é aberto pelas emendas parlamentares ou
pelos convênios intermediados entre eles e os dois outros governos, isto
sem se falar nos empregos, talvez a parte menos onerosa para o Erário.
Uma fiscalização percuciente da aplicação desses recursos, sem dúvida,
constatará que parte deles foi utilizada para fins eleitorais. E quando
os valores das emendas e convênios são considerados insuficientes para
satisfazer os “vaqueiros”, é imperioso o aporte de reais para fechar a
conta correspondente aos preços estipulados por voto.
Lamentavelmente, pela falta de educação política, de compromisso com a
causa pública, aliado ao interesse pessoal e familiar de muitos dos
pretendentes a ter mandatos eletivos, mulheres e homens cônscios de suas
responsabilidades cidadãs têm que recorrer às forças repressivas
oficiais para inibirem as ações maléficas deturpadoras dos resultados do
pleito e, por extensão, a formação de uma representação política
deformada, sem compromisso com os verdadeiros interesses da sociedade,
resultando, daí, a má gestão dos recursos dos executivos, assim como no
negativo desempenho dos diversos legislativos.
O eleitor é, sim, por fim, o principal responsável e vítima dessa
situação real. Ele quase nunca recebe os R$ 100 ou R$ 70 como foi
negociado com os candidatos, mas sofre todas as consequências por ter
aceitado ser guiado por inescrupulosos.