
O Ministério Público Federal (MPF) e a Constroladoria Geral da União
(CGU) devem trabalhar juntos para forçar a devolução de mais de R$ 200
milhões transferidos, indevidamente, como auxílio emergencial a agentes
públicos.
São cerca de 300 mil funcionários de prefeituras e governos, que
receberam, sem provar necessidade, os R$ 600 por meio da Caixa Econômica
Federal. A CNN descobriu quem são essas pessoas e conversou com algumas delas.
A
CGU informou que o Ministério da Cidadania vai bloquear os pagamentos
irregulares que ainda não foram liberados. A pasta criou um site para
quem recebeu, indevidamente, poder devolver o dinheiro, sem o risco de
sofrer um processo.
O montante equivale a dez vezes a soma do que foi gasto para
construir os hospitais de campanha do Anhembi e do Pacaembu em São
Paulo, o de Águas Lindas em Goiás e o da Expominas em Belo Horizonte.
Esse foi o valor aprovado pela Dataprev em auxílios indevidos para
agentes públicos, ou seja, para quem já tem emprego garantido em
prefeituras, governos estaduais e até no governo federal e, mesmo assim,
teve o benefício condedido. Mais de 317 mil agentes públicos receberam
auxílio emergencial indevidamente
O recurso foi reservado para desempregados e para quem está
atravessando a pandemia na informalidade, como ambulantes e
entregadores.
Entre os que não mereciam, mas tiveram o dinheiro público depositado,
estão médicos, bombeiros, policiais, professores, agentes
penitenciários, funcionários da saúde e estagiários de prefeituras e
governos estaduais. A lista tem gente nomeada por concurso público,
indicados de políticos e até aposentados.
Em Pernambuco, por exemplo, econtramos soldados, professores e
técnicos de enfremagem, um total de 2.900 pessoas que não deveriam, mas
receberam o dinheiro.
No Espírito Santo, o auxílio emergencial foi transferido para quase
quinhentos professores, além de auxiliares de serviços gerais e
enfermeiros, somando 2.300 parcelas pagas indevidamente.
Ao todo, o dinheiro caiu na conta de 292 mil servidores de
prefeituras e estados em todo o país, com quase R$ 208 milhões
transferidos. Outros mais de 7 mil funcionários civis de órgaos ligados
ao governo federal também receberam parcelas do auxílio.
Pra poder chegar a esse detalhamento de quem recebeu o auxílio
emergencial sem ter o direito ao benefício, nossa equipe de jornalismo
de dados cruzou a lista do portal da transparência, que tem o nome e CPF
de quem teve o dinheiro depositado na conta com os bancos de dados dos
governos estaduais, como Espírito Santo, Maranhão, Distrito Federal e
Pernambuco, além do banco de dados dos próprios servidores federais. Só
assim a gente conseguiu cruzar o nome e CPF pra ter um detalhamento mais
preciso.
A Dataprev diz que fez cruzamentos com informações disponibilizadas
pela Receita Federal e por órgãos de registros de servidores militares e
civis, mas não soube explicar por que o filtro deixou passar tanta
gente.
A CNN teve acesso a um despacho do Ministério
Público que pede autorização para cruzar dados do auxílio emergencial
com o sistema Prometheus, da Polícia Federal, usado para monitorar o uso
de moedas falsas, fraudes e o acompanhamento dos CPFs de quem saca o
dinheiro. O MP prepara um trabalho coordenado com a CGU para forçar o
bloqueio nas contas e a devolução de quem não precisava, mas solicitou e
recebeu o dinheiro.
A CGU reconhece que primeiro veio o pagamento e, só depois, o cruzamento dos depósitos de quem realmente precisava do socorro.
Por telefone, falamos com alguns desses beneficiados pelo Brasil.
Muitos negam que tenham pedido o dinheiro e prometem devolver as
parcelas de R$ 600.
“Que eu me lembre, não tem pedido nenhum não, mas eu tenho que ver
isso aí certinho porque eu… eu não requisitei nada. Tá entendendo? Eu
vou ter que dar um jeito de devolver isso aí, porque eu não pedi’, disse
um dos beneficiários.
“Eu não pedi nada. Primeiro que eu, mesmo se eu não estivesse
trabalhando… Primeiro lugar que eu tô trabalhando desde o início do ano.
Segundo lugar que o negócio foi agora. Eu acho um absurdo. Quem faz
isso deveria ser preso, preso e pagar três vezes mais o valor que
deveria valer”, afirmou outro.
Sobra para uns, falta para outros. Leonardo Victor Nastari é
cabeleireiro e trabalha em São Paulo, onde os salões foram fechados por
ordem do governo estadual no início da quarentena. Ele ficou com uma mão
na frente e outra atrás.
“Não consegui o auxílio, né? No caso, eu fiquei esperando três meses
para ser aprovado, e esses dias mesmo eles vieram me informar que eu não
fui aceito porque um membro da minha família estava recebendo, sendo
que ninguém da minha família estava recebendo, que eu saiba. Eu gostaria
de saber como que fica a situação, porque eu não tenho renda fixa”,
lamentou.