Falar sobre saúde cardiovascular, obesidade,
câncer, dentre outras doenças associadas a má alimentação é algo
bastante frequente. Entretanto, pouco se discute sobre os riscos de
danificar, permanentemente, o sistema nervoso, principalmente a visão,
em decorrência de uma dieta pobre. Estudo recente comprova esta
realidade e nutricionista orienta sobre o potencial de determinados
alimentos quando o assunto é visão.
Um caso extremo de comer "exigente" causou perda da visão em um
jovem, de acordo com estudo publicado no Annals of Internal Medicine. Os
pesquisadores da Universidade de Bristol, que examinaram o caso,
recomendam que os médicos considerem a neuropatia óptica nutricional em
pacientes com sintomas visuais inexplicáveis e dieta pobre,
independentemente do Índice de Massa Corporal (IMC), para evitar perda
permanente da visão.
"A neuropatia óptica nutricional é uma disfunção do nervo óptico,
importante para a visão. A condição é reversível, se detectada cedo.
Mas, se não tratada, pode levar a danos estruturais permanentes no nervo
óptico e perda da visão", afirma o oftalmologista Virgílio Centurion,
diretor do Instituto de Moléstias Oculares (IMO).
Em países desenvolvidos como o Reino Unido, as causas mais comuns de
neuropatia óptica nutricional são problemas intestinais ou medicamentos
que interferem na absorção de nutrientes importantes para o estômago. As
causas puramente alimentares são menos comuns porque o suprimento de
alimentos é bom, mas em outros lugares do mundo, pobreza, guerra e seca
estão ligadas à desnutrição e a taxas mais altas de neuropatia óptica
nutricional.
Cientistas clínicos da Bristol Medical School e do Bristol Eye
Hospital examinaram o caso de um paciente adolescente que procurou um
clínico geral com queixa de cansaço. A ligação entre seu estado
nutricional e a visão não foi detectada de imediato, quando sua
deficiência visual tornou-se permanente.
Vitaminas
Apesar de ser um "comedor exigente", o paciente apresentava IMC e
altura normais, sem sinais visíveis de desnutrição e não tomava
medicamentos. Os testes iniciais mostraram anemia macrocítica e baixos
níveis de vitamina B12, que foram tratados com injeções de vitamina B12 e
orientação dietética.
Quando o paciente voltou ao hospital, um ano depois, os sintomas de
perda auditiva e de visão haviam se desenvolvido, mas nenhuma causa foi
encontrada. Aos 17 anos, a visão do paciente piorou progressivamente, a
ponto de chegar à cegueira.
Investigações posteriores descobriram que o paciente apresentava
deficiência de vitamina B12, baixos níveis de cobre e selênio, alto
nível de zinco e acentuado nível reduzido de vitamina D e densidade
mineral óssea. Desde o início do ensino médio, o jovem consumia uma
dieta limitada a batatas fritas, pão branco e carne de porco processada.
No momento em que a condição do paciente foi diagnosticada, ele
apresentava visão prejudicada permanentemente.
Os pesquisadores concluíram que a dieta junk food (alimentos com alto
teor calórico, mas com níveis reduzidos de nutrientes) do paciente e a
ingestão limitada de vitaminas e minerais nutricionais resultaram no
aparecimento de neuropatia óptica nutricional. Eles sugerem que a
condição pode se tornar mais prevalente no futuro, dado o consumo
generalizado de junk food, em detrimento de opções mais nutritivas, e a
crescente popularidade do veganismo (se a dieta vegana não for
suplementada adequadamente para evitar a deficiência de vitamina B12).
"A visão impacta nossa qualidade de vida, educação, emprego,
interações sociais e saúde mental. O caso relatado no estudo destaca o
impacto da dieta na saúde visual e física e o fato de que a ingestão de
calorias e o IMC não são indicadores confiáveis do estado nutricional",
afirma a neuro-oftalmologista Márcia Marques, que integra o corpo
clínico do IMO.
A equipe de pesquisadores recomenda que o histórico da dieta faça
parte de qualquer exame clínico de rotina, como perguntar sobre
tabagismo e ingestão de álcool. "Isso pode evitar que o diagnóstico de
neuropatia óptica nutricional seja esquecido ou descartado, pois algumas
perdas visuais associadas podem ser recuperadas totalmente se as
deficiências nutricionais forem tratadas com antecedência suficiente",
afirma a oftalmologista Márcia Marques.