Acompanhar futebol no Estado do Ceará é momento
célebre. Em tempos de efervescência, o esporte supera a prática das
ruas, movimenta renda, público e o povo: é cultura. E se a paixão reside
no lúdico e imensurável, os números expressam a força das camisas e dos
clubes. O Sistema Verdes Mares traz uma pesquisa inédita, em parceria
com o Instituto Opnus, com um raio-x dos torcedores residentes na
região.
Ao todo, foram entrevistados 2.050 pessoas nos 184 municípios
cearenses. O material mostra que o Flamengo tem a maior torcida do
Estado, com 17%. A constatação veio com dados apurados entre os dias 12 e
19 de outubro, usando como referência a faixa etária acima de 16 anos.
A liderança do ranking, no entanto, é acompanhada de perto por Ceará e
Fortaleza, os principais clubes locais e que protagonizam uma
rivalidade centenária. O detalhe fica com a predominância da massa
alvinegra, que soma 15%, enquanto os tricolores aparecem em 3º, com 12%.
O intervalo de confiança da pesquisa é 95%, com margem de erro de
2,1%. O top-8 das torcidas é formado por Corinthians (7%), São Paulo
(5%), Seleção Brasileira (4%), Palmeiras (3%) e Vasco da Gama (3%).
Outros times aparecem com 1%, enquanto 32% dos consultados declaram não
torcer por nenhum clube. Em coletiva pós-jogo com o Fortaleza, na Arena
Castelão, o português Jorge Jesus, técnico do Flamengo, reiterou o peso
da torcida rubro-negra.
"O Brasil é um país grande esportivamente, cada um torce para quem
quiser. O Flamengo é uma nação porque está em todos os estados, na
maioria há mais Flamengo que outros times. Isso foi a história do
Flamengo, grandes jogadores, como Zico, e é por isso que tem tantos
adeptos".
A superioridade existe também no Brasil, como um levantamento do
Datafolha divulgou em setembro. O clube apareceu no topo da lista de
principais torcidas, com 20% do recorte nacional. Para o diretor de
marketing do Ceará, Lavor Neto, a disparidade existe, mas tem diminuído
com os novos meios de comunicação.
"O fenômeno Flamengo existe e deve se replicar em outros estados
porque, por muito tempo, o único meio de acesso à informação era a TV
aberta, que priorizava paulistas, cariocas e o eixo sul do País.
Gerações foram formadas assim. A pesquisa funciona como um alerta porque
mostra que temos espaço propício para buscar ainda mais torcedores",
declarou.
No lado tricolor, o presidente em exercício, Marcello Desidério,
explicou que a carência de títulos tem influência na escolha do
torcedor. "Antigamente, o futebol local era incipiente. Não tínhamos
conquistas expressivas. Com o crescimento de Ceará e Fortaleza, isso
começou a mudar. Se os dois estiverem bem, puxamos esses dados a nosso
favor com os resultados dentro de campo", afirmou o dirigente.
Disparidade no interior
A presença de um clube carioca como principal da lista em um ano de
Clássico-Rei na Série A do Brasileiro é sintomática. O apelo é
construído porque o Flamengo tem amplo domínio na região interiorana do
Estado, justamente onde o torcedor parece mais distante de Vovô e Leão.
O recorte traz um Rubro-Negro com 25% do total, enquanto Corinthians
tem 10% e São Paulo conta com 7%. A força dos simpatizantes de outros
clubes é evidente nos jogos da Arena Castelão, em que os públicos são
grandiosos também porque a torcida visitante ocupa os setores
disponíveis.
Nesses espaços do Estado, Ceará e Fortaleza somam apenas 6% e 3%,
respectivamente. A divergência frente aos "times intrusos" está na
Capital, onde o contexto é completamente revertido e o Flamengo, por
exemplo, angaria 6% da preferência da torcida.
A baixa adesão nas demais cidades cearenses tem sido alvo de estudo e
planejamento por parte dos arquirrivais, inclusive com projetos criados
em 2017, já nas atuais gestões dos clubes. A especificidade fica
exposta na estratégia designada para conquistar novos adeptos.
A exemplo do Ceará, que busca consolidar a marca explorando a própria
difusão dos apaixonados pelo time. O foco é investir na criação de
grupos de torcedores longe da Capital, sendo denominados de consulados.
Com 60 conglomerados espalhados entre o Brasil e o exterior, 50% da
quantia fica localizada no interior cearense.
"O Ceará é um time bem acolhido Brasil afora. Ano passado até
brincamos que era o 2º time de todo mundo no Brasileirão e esse carinho é
visualizado nas redes sociais. Se temos essa empatia até dos que torcem
para outros times, precisamos trabalhar para fidelizá-los", disse
Lavor.
A política também remete ao conceito de Time do Povo, explorado nas
redes sociais e que originou um plano de sócio-torcedor mais barato aos
interessados em acompanhar os jogos do Brasileirão.
Inovação como caminho
Criar iniciativas ao sócio torcedor é uma das principais alternativas
trabalhadas pelo Fortaleza para crescer no interior. O clube é o único
do Estado com um plano específico aos adeptos longe da Capital,
inclusive com valores mais acessíveis que as demais ofertas.
"Procuramos estar onde o torcedor vive. Implantamos o Leão no
Interior há dois anos e sempre visitamos os municípios com líderes de
torcida e o mascote para atrair esse público. É tudo intensificado no
Campeonato Cearense e, com marca própria, temos possibilidade de
desenvolver outros produtos", disse Desidério.
Além disso, o clube foi pioneiro ao criar uma camisa popular oficial.
O material está sendo produzido e entrará no mercado do interior em
2020, na 2ª fase de vendas.