Brasília. O procurador-geral da República, Rodrigo
Janot, denunciou, ontem, ao Supremo Tribunal Federal (STF) o presidente
Michel Temer e o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures, que já foi seu
assessor, por corrupção passiva. Temer é acusado de ter recebido propina
do frigorífico JBS, usando Rocha Loures como intermediário. Janot
solicitou ainda que o presidente seja condenado a pagar uma indenização
por danos morais ao País no valor de R$ 10 milhões. No caso do
ex-assessor, que se encontra preso desde 3 de junho, o valor pedido é de
R$ 2 milhões.
É a primeira vez na história da República que um presidente é acusado
formalmente de crime durante o exercício do mandato. Em 1992, Fernando
Collor de Mello foi denunciado quando já estava afastado do cargo.
Janot pediu também a abertura de um novo inquérito contra Temer e
Loures para investigá-los por corrupção passiva e lavagem de dinheiro em
possíveis irregularidades em um decreto que regula a exploração de
portos, para favorecer empresa Rodrimar, que atua no Porto de Santos
(SP), área de influência do presidente e do PMDB.
Segundo Janot, Temer "recebeu para si", por meio de Loures, a "vantagem
indevida de R$ 500 mil ofertada" por Joesley Batista, sócio da JBS, e
entregue numa mala ao ex-assessor.
De acordo o procurador, o presidente recebeu os recursos "entre os
meses de março a abril de 2017, com vontade livre e consciente" e
"valendo-se de sua condição de chefe do Poder Executivo e liderança
política nacional".
A PGR diz ainda que, "além do efetivo recebimento do montante espúrio
mencionado", Temer e Loures "em comunhão de esforços e unidade de
desígnios, com vontade livre e consciente, ainda aceitaram a promessa de
vantagem indevida no montante de R$ 38 milhões".
A partir de agora, o ministro Edson Fachin, relator no STF, deve
decidir quando enviará a denúncia à Câmara, que precisa dar o aval para o
Supremo decidir se abre ou não um processo.
Se a ação penal for aberta, Temer se transforma em réu no Supremo,
podendo então ser condenado ou absolvido ao seu final. A pena por
corrupção passiva vai de 2 a 12 anos de prisão.Ele ficaria afastado por
até 180 dias para ser julgado. O presidente nega as acusações. "O valor
jurídico do relatório é nenhum", disse Antônio Cláudio Mariz de
Oliveira, advogado de Temer.
Janot diz que Joesley e Ricardo Saud, da JBS, não são alvo da denúncia em razão do acordo de delação homologado pelo STF.
A denúncia por corrupção é baseada nas tratativas de Loures para
receber os recursos da JBS e favorecer a empresa no Conselho
Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Segundo a PGR, houve
"intervenção ilícita" dos denunciados para ajudar o frigorífico no órgão
do governo.
O procurador-geral afirma que "não há dúvida, portanto, de que o delito
perpetrado pelos imputados Michel Temer e Rodrigo Loures, em comunhão
de ação e unidade de desígnios, causou abalo moral à coletividade".
"Os crimes praticados à sorrelfa, valendo-se de seus mandatos eletivos,
possuem alto grau de reprovabilidade", diz Janot. Temer e Loures, cita o
procurador, "desvirtuaram as importantes funções públicas que exercem,
visando, apenas, ao atendimento de seus interesses escusos".
Segunda denúncia
A PGR terá prazo até a próxima segunda-feira para apresentar uma
segunda denúncia, desta vez pelo crime de obstrução à investigação de
organização criminosa. O relatório final da Polícia Federal, entregue
ontem, afirmou que o presidente atuou para embaraçar investigações.
O documento diz ainda que Temer "deixou de comunicar as autoridades
sobre suposta corrupção de membros do Judiciário e do Ministério
Público". Os delegados entenderam, com base na gravação, que a "única
interpretação possível" é de que Temer incentivou a continuação de
pagamentos para Eduardo Cunha (PMDB-RJ), ex-presidente da Câmara, no
sentido de que ele ficasse em silêncio. Ele está preso desde outubro de
2016.