Uma
menina de dez anos de idade que ficou grávida, depois de ter sido
estuprada durante quatro anos pelo tio, em Vitória, no Espírito Santo,
não só viu o seu nome ser divulgado na internet pela militante de
extrema-direita Sara Winter, como foi alvo de uma manifestação por parte
de extremistas religiosos, em frente à maternidade onde estava
internada, onde foi apelidada de "assassina", por manifestar a intenção
de abortar.
O
caso da criança, que se tornou conhecido no início deste mês, já passou
por um longo processo. Primeiro, o aborto teve de ser autorizado pela
justiça, num despacho publicado na sexta-feira, onde se defendia o
supremo interesse e a defesa da vida da menina. Depois, o hospital onde
estava recusou-se a fazer o procedimento legalmente autorizado.
A
avó da menina teve de mudar de estado, deslocando-se para o Recife,
onde uma unidade de Saúde se prontificou a fazer o procedimento.
Recorde-se que a a lei brasileira permite a interrupção voluntária da
gravidez até às 22 semanas de gestação ou até o feto pesar 500 gramas -
algo que se altera caso a gravidez seja fruto de estupro. A menina
estava na 21.ª semana quando deu entrada no hospital pela primeira vez,
tendo desenvolvido diabetes gestacional, que se poderia agravar com o
avançar da gravidez.
O agressor, de 33 anos de idade, continua foragido.
Neste
domingo (16), porém, vários integrantes de grupos evangélicos foram
para a frente do hospital onde a menina iria ser submetida ao
procedimento (acabou por ser realizado no mesmo dia), tentando invadir a
unidade de Saúde e, até, chamando a criança de "assassina", de acordo
com ativistas no local.
"Eles
tentaram invadir o hospital, chegaram até a quebrar a porta do
hospital. A polícia teve de intervir. Gritavam, chamando a menina de
assassina, dizendo que ela tinha de gestar [gerar] um feto causado por
decorrentes estupros que vinha sofrendo há quatro anos. Estamos aqui
tentando salvaguardar o direito dessa criança de realizar o aborto
legal, que é previsto em lei desde o código de 1940”, disse Elisa
Aníbal, advogada e integrante da organização Grupo Curumim, citada pela
imprensa.
A
identidade da criança e o nome do hospital onde estava internada foram
divulgados na internet por Sara Winter, chefe do grupo '300 do Brasil' e
fiel apoiadora de Jair Bolsonaro, que está com tornozeleira eletrônica
depois de ser condenada por protestos antidemocráticos. A militante de
extrema-direita identificou, inclusive, o médico que iria fazer o
aborto.
Os
extremistas não só ficaram pelo hospital, perseguindo até a família da
criança. A justiça de São Mateus, no estado de Espírito Santo, está
investigando se houve pressão à avó da criança, com quem esta morava,
para que o aborto não fosse realizado. A avó teria recebido visitas de
desconhecidos em pelo menos duas ocasiões diferentes.