Policiais militares da Coordenadoria Integrada de
Operações Aéreas (Ciopaer) são suspeitos de realizar voos particulares
no Ceará, até com uma frequência maior do que pilotam aeronaves do
Estado. Os principais clientes são empresas e grandes empresários. A
Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e
Sistema Penitenciário (CGD) abriu procedimento investigativo contra três
deles, conforme apurou o Sistema Verdes Mares. Um dos oficiais já teve o
procedimento julgado e foi inocentado pela Controladoria.
O último PM a ter a investigação formalizada foi o tenente-coronel
Edinardo de Lima Ferreira. Um Conselho de Justificação (apuração
administrativa contra oficiais) foi instaurado pela CGD para apurar a
conduta do militar, em 5 de dezembro do ano passado, e publicado em
portaria, no Diário Oficial do Estado (DOE) do dia 19 daquele mesmo mês.
Segundo o documento, o oficial da PM "estaria supostamente exercendo
atividade paralela de piloto de helicóptero na iniciativa privada,
inclusive em horários que deveria estar de serviço (na Ciopaer)".
De acordo com a Controladoria, há indícios, na investigação
preliminar, de que o militar pilotava duas aeronaves particulares com
frequência, a ponto de que 80% dos voos que ele realizava não serem a
serviço da Polícia Militar do Ceará (PMCE). As apurações apontam que, em
dias que estava de serviço, o tenente-coronel participou de nove voos
particulares durante o ano de 2017; 12 voos em 2016; e 25, no ano de
2015.
Um Conselho de Justificação também foi aberto contra o
tenente-coronel Kléber Nóbrega Vieira, no dia 8 de agosto de 2018, e
publicado no DOE do dia 24 daquele mês. O documento revela que "a escala
de serviço da Ciopaer, no período compreendido entre os anos 2015 a
2017, choca-se em datas com diversos voos privados realizados pelo
oficial, em possível detrimento ao cumprimento de operações acionadas
pela Ciops (Coordenadoria Integrada de Operações de Segurança), com
prejuízo para o serviço e afetando a dignidade da função pública".
Nas portarias, a CGD considera que, conforme estudos do Centro de
Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos (Cenipa), a "fadiga
de voo" pode contribuir para acidentes aeronáuticos, e a conduta dos PMs
contraria as regras de segurança de voo e colocam em risco a
incolumidade pública e o patrimônio do Estado.
Conforme os documentos, é vedado aos militares estaduais - com
exceção dos oficiais do Quadro de Saúde - exercer atividades
profissionais no meio civil, e as atitudes desses policiais, em tese,
ferem os valores da moral militar, violam os deveres do Código
Disciplinar da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros Militar do Ceará e
significam transgressão disciplinar.
Após a abertura dos procedimentos administrativos, o tenente-coronel
Edinardo pilotou aeronaves da Ciopaer cinco vezes, em missões no
interior do Ceará, e recebeu o valor total de R$ 239,90 em diárias;
enquanto o tenente-coronel Nóbrega viajou apenas uma vez, para
Donauworth, na Alemanha, para participar de reuniões técnicas de
configuração de aeronaves, o que custou R$ 19.513,18 para o Estado. As
informações constam no Diário Oficial do Estado.
Vínculo
Outro militar de alta patente suspeito de realizar voos particulares
teve um Conselho de Justificação instaurado contra ele pela
Controladoria no dia 21 de outubro de 2014 e publicado no DOE dez dias
depois (na época, ele era major e piloto da Ciopaer).
A portaria traz a denúncia de que o servidor público, que não terá o
nome divulgado por ter sido inocentado, acumulava vínculo empregatício
com empresas aéreas. O Terceiro Centro Integrado de Defesa Aérea e
Controle de Tráfico Aéreo do Comando da Aeronáutica informou que o
policial pilotou três aeronaves particulares, entre o período de
setembro de 2012 e fevereiro de 2013. Enquanto o Instituto Nacional de
Seguro Social (INSS) forneceu informações que comprovavam a prática
ilegal, como o número de inscrição, nome do empregador e os valores da
remuneração do trabalhador. No entanto, em nota, a CGD informou que o
militar foi julgado e "não foi possível concluir haverem elementos a
indicar a prática de transgressão disciplinar".
O Sistema Verdes Mares também recebeu denúncia de que outro militar
pilota aeronaves de empresas e empresários, no Estado. Apesar de não
localizar procedimento investigativo contra o oficial, a reportagem
comprovou a prática com uma multa efetuada pela Agência Nacional de
Aviação Civil (Anac) ao militar, por "infringir as normas e regulamentos
que afetem a disciplina a bordo de aeronave ou a segurança de voo" em
uma aeronave particular, em 2011.
Segundo documento da Anac, a defesa do piloto alegou, na época, que a
fiscalização do Aeródromo Pinto Martins, em Fortaleza, "em nenhum
momento solicitou a apresentação do CCF. Afirma ainda que o CCF
(Certificado de Capacidade Física) estava devidamente guardado em porta
documento específico, no sentido de evitar danos ou desgaste ao
documento. Também afirmou que o referido piloto possui mais de 16 anos
de aviação civil, com conduta ilibada e sem qualquer registro que possa
desabonar sua trajetória como aeronauta". Apesar do recurso, a multa foi
mantida pela Assessoria de Julgamento de Autos em Segunda Instância
(ASJIN).
Posicionamento
Questionada sobre as investigações, a CGD informou, em nota, que "os
atos passíveis de divulgação já foram publicados em Diário Oficial do
Estado. Além disso, informa (que) anterior à instauração de um processo
regular, a CGD não pode publicizar seu teor por dizer respeito a
procedimento de caráter reservado". Informou ainda que "sobre o caso que
teria ocorrido em 2011, não consta nada".
A Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) afirmou,
também em nota, "que não comenta investigação em andamento realizada
pela Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e
Sistema Penitenciário do Estado do Ceará (CGD)". Os policiais militares
citados não foram localizados pela reportagem.