Os reflexos das ações da facção local Guardiões do Estado (GDE)
continuam causando danos na Segurança Pública do Ceará. Nessa
sexta-feira (2), a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social
(SSPDS) precisou intervir em um impasse entre a Polícia Militar e a
Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública (CGD),
gerado após a detenção de uma criança e três adolescentes. O trio era
suspeito de arrancar as pedras da calçada do 22ºBPM e escrever uma
mensagem de afronta à Corporação.
Os garotos, supostamente integrantes da facção criminosa Guardiões do
Estado (GDE), foram detidos na Comunidade do Pau Fininho, no bairro
Papicu, por uma patrulha da 1ªCia do 22ºBPM. Eles foram levados à
Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA), mas o caso teve uma
reviravolta.
A CGD recebeu uma denúncia de que os militares tivessem torturado a
criança e os adolescentes. Durante uma vistoria realizada na viatura
foram encontradas uma pequena quantidade de drogas que, conforme os
militares, teria sido apreendida com os adolescentes e seria apresentada
na DCA; e nas proximidades do carro da PM havia uma espécie de máquina
de choque.
Em nota enviada à reportagem, a CGD chegou a afirmar que os militares
haviam sido autuados, na sede da Controladoria por tortura, tráfico de
drogas e coação no curso do processo. Os adolescentes teriam apresentado
sinais de agressões e afirmado que foram sequestrados e torturados
pelos policiais.
No entanto, a versão sobre as agressões foi rebatida pelos policiais do
22ºBPM; pela Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS),
que enviou um representante à CGD para tratar do caso; e pela própria
família dos suspeitos. Horas depois, os militares foram liberados, e os
flagrantes não chegaram a ser concluídos. O caso será apurado por
portaria.
Uma fonte que conversou com a reportagem disse que o caso gerou
agitação na cúpula da SSPDS. "O Ceará passa por uma crise sem
precedentes na Segurança Pública. Imagine que suspeitos de tentar
desmoralizar a Polícia, membros da facção que está desafiando o Governo
fossem liberados, e os policiais ficassem presos. A tropa ficaria
completamente desmotivada e já havia até rumores de que alguns se
articulavam para uma paralisação", declarou.
O policial afirmou que o trabalho da Polícia nas comunidades dominadas
pelo tráfico é cada vez mais difícil. "O cerco está se fechando. A
Polícia está ficando acuada", afirmou.
Ofensiva
O fato relacionado à captura dos quatro jovens e prisão dos militares
teve início, na manhã da última quinta-feira (1º), quando a facção
criminosa GDE investiu, mais uma vez, contra a Segurança Pública do
Ceará. Pedras da calçada do Batalhão foram arrancadas para formar a
frase "GDE 745: tudo nosso. Tudo 3", na calçada da própria unidade da
Policia Militar.
Desde então, segundo o major Hideraldo Bellini, comandante da 3ªCia do
22ºBPM, a Polícia vinha procurando os responsáveis pelo atentado. Pouco
mais de 24h após a investida criminosa, familiares dos envolvidos teriam
entrado em contato com a PM afirmando que eles iriam se apresentar,
contanto que tivessem a segurança garantida.
O major conta que a criança de 11 anos e os adolescentes de 13 e 15
anos foram até o Batalhão e, enquanto eram levados até a Delegacia da
Criança e do Adolescente (DCA), um traficante da GDE foi até a sede da
CGD denunciar que os militares tinham torturado o trio.
"Nós ocupamos a favela devido à demonstração de força da GDE. Os
adolescentes se apresentaram. O chefe do tráfico do 'Pau Fininho' mandou
um outro traficante vir na CGD dizer que os meninos tinham sido
agredidos. Nossos policiais se encontraram com esse traficante
denunciando na CGD. Um sargento bateu boca com ele e a delegada mandou
dar uma geral na viatura caracterizada", contou Hideraldo Bellini.
Apreensões
A CGD diz que a droga encontrada com os militares não teria nenhuma
relação com o procedimento em curso. A Controladoria informou que junto
aos policiais também havia equipamentos para choque, sacos plásticos e
luvas. "As vítimas foram encaminhadas para realizarem exame de corpo de
delito. A CGD já iniciou as investigações, que serão apuradas na seara
disciplinar", disse o órgão. Bellini afirma que os policiais agiram
dentro da legalidade. Com relação ao equipamento de choque, o major
afirma que o objeto não estava dentro da viatura.
"A GDE desafia a gente e os policiais acabam presos? Como é que um bom
policial combate facção desse jeito? Essa máquina foi encontrada perto
da viatura. Não teve tortura. Tudo aconteceu muito rápido. Eu quero
saber que inversão de valores é essa. Assim não há condição de
trabalhar", disse o major.
Defesa
O presidente do Conselho de Defesa do Policial da Secretaria da
Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), Ricardo Valente, afirmou que o
delegado decidiu não autuar os policiais em flagrante, após ter
percebido que a denúncia do traficante tinha como única intenção retirar
os servidores das ruas. Valente disse que, quando informado sobre as
prisões, o secretário André Costa se indignou e ordenou que fosse dado
todo o apoio necessário.
"Foram devolvidas as armas e decidido que eles vão voltar às ruas
imediatamente. São policiais conhecidos, que trabalham muito bem.
Juntamente com o governador, André Costa pediu que fossem tomadas todas
as providências cabíveis", afirmou Ricardo Valente.
A reportagem entrevistou familiares dos quatro garotos capturados.
Todos reiteraram que eles não foram vítimas de maus tratos. "Eu mesma
levei meu filho no Batalhão. Ninguém apanhou. O meu filho contou que
pegou as pedras por brincadeira. Disse que a ideia surgiu enquanto ele
estava brincando de bola com os amigos", contou a mulher, de nome não
revelado.
Um outro pai lembrou que seu filho, de 13 anos, não foi obrigado por
ninguém a participar do atentado. "Ele é uma criança. Talvez não
soubesse o que estava fazendo, mas depois soube que não foi certo. Ele
vê essas coisas da GDE e quer copiar", afirmou.