Um esquema de fraudes, que furtou pelo menos R$ 7,5 milhões de contas
bancárias do Banco do Brasil, Caixa Econômica Federal e Itaú e fez mais
de mil vítimas em todo o País, foi desarticulado pela 'Operação
Valentina', deflagrada pela Polícia Federal (PF), ontem. Ao todo, 13
pessoas foram presas, a maior parte delas no Ceará, onde se concentrava a
quadrilha e estavam os quatro líderes da organização criminosa; somente
uma pessoa foi detida no Estado de São Paulo.
A investigação, iniciada em junho do ano passado, partiu dos setores de
segurança do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal, que
receberam reclamações de um grande volume de clientes, vítimas de golpes
que desfalcaram suas contas bancárias. A PF instaurou inquérito e
identificou que uma só quadrilha, instalada no Ceará, era responsável
pelo prejuízo financeiro de centenas de pessoas físicas e das
instituições financeiras.
O grupo criminoso tinha várias maneiras de realizar as fraudes
bancárias, entre elas o golpe do boleto falso, que consiste no envio de
um boleto para o e-mail da vítima, que realizava o pagamento; e o envio
de um link, também por e-mail, para que a vítima realizasse um cadastro
e, sem saber, entregasse dados pessoais à quadrilha.
Porém, o principal meio encontrado pelos bandidos era o serviço de
internet banking, que dá acesso às contas bancárias por dispositivos
móveis e computadores, com a ajuda de um funcionário de uma operadora de
telefonia. "Os funcionários das operadoras recebiam uma determinada
quantia do grupo para bloquear o número de contato da vítima e habilitar
esse número de contato no chip do fraudador. De posse desse número
'clonado', o fraudador acessava a conta bancária. Porque ele já tinha
conseguido, através de um software 'malicioso', ter acesso ao número de
conta, agência, código da agência e senha de acesso do internet
banking", detalhou o chefe da Delegacia de Repressão de Crimes
Fazendários, delegado Madson Henrique Tenório. "É um crime de
inteligência", avaliou.
A PF obteve provas de que a quadrilha atuava desde o início de 2016,
mas devido à organização do grupo, o delegado Madson Tenório admitiu que
os criminosos podem estar realizando o golpe há mais tempo e que a PF
não conseguiu contabilizar ainda o número total de vítimas.
"Eu não posso dizer um valor exato, porque ainda está sendo apurado
pelas equipes de investigação. Também ainda estamos em contato com as
instituições financeiras prejudicadas, para elas passarem as informações
delas e checarmos com as nossas. Mas, no mínimo, foram mil pessoas
lesadas, porque os ataques eram diários e a quase 15, 20 minutos",
explicou Tenório.
O delegado afirmou que a preferência do bando era por moradores de
outros Estados. "Justamente para dissimular as ações criminosas e para
dificultar o rastreamento. É mais difícil um cliente de outro Estado
fazer uma denúncia do que está ocorrendo na conta dele, devido a
quadrilha ser sediada aqui".
Membros
Segundo a Polícia Federal, todos os investigados são cearenses. Os
mandados expedidos pela Justiça Federal foram cumpridos na Capital, nos
bairros Meireles, Mondubim, Castelão, João XXIII e Cidade 2000; e nos
municípios de Caucaia e Maracanaú, na Região Metropolitana de Fortaleza
(RMF).
O líder do grupo era o responsável por disseminar os softwares
'maliciosos' (malweres), principalmente através de SMS, para capturar os
dados do aplicativo do internet banking das vítimas. "Ele é o líder e o
hacker do grupo. E também cooptava pessoas para acessar as unidades de
resposta das instituições financeiras, que é aquele sistema de telefonia
que você liga e cai no 'robozinho', que só faz responder e dá um saldo
daquela conta. Muitas dessas pessoas faziam as ligações para ver se a
vítima tinha saldo e se valia a pena atacar aquela conta", explicou
Tenório.
De acordo com o superintendente da Polícia Federal no Ceará, Delano
Cerqueira Bunn, os suspeitos viviam ostentando o dinheiro que conseguiam
com golpes e não se preocupavam nem em ter 'empregos de fachada'. "Essa
organização criminosa tinha sinais exteriores de riqueza, manifestados
nas redes sociais, que também chamaram atenção da Polícia Federal".
A PF sequestrou imóveis não contabilizados e apreendeu seis veículos
luxuosos, que somam cerca de R$ 900 mil. Na residência de dois
suspeitos, também foram apreendidas duas armas de fogo. O líder do grupo
criminoso tinha uma cadela da raça Golden Retriever, com a qual posava
em fotos nas redes sociais, ostentando. O nome do animal, 'Valentina',
batizou a operação da PF por ser um bem valioso localizado com o
suspeito.
No total, foram cumpridos 13 mandados de prisão (sete preventivas e
seis temporárias), oito mandados de condução coercitiva, 25 mandados de
busca e busca e apreensão e o sequestro de bens móveis e imóveis. Um dos
alvos da operação não foi localizado pela PF, mas se apresentou na
Superintendência Regional. Os mandados foram expedidos pela 32ª Vara da
Justiça Federal no Ceará.
Confiança
Delano Bunn disse que a operação tem como objetivos repreender as
fraudes e restabelecer a confiança entre as instituições e os
consumidores. "As relações jurídicas entre instituições financeiras,
estabelecimentos comerciais e consumidores são regidas pelo princípio da
confiança. Quando quadrilhas atuam na prática de fraudes bancárias com o
desvio de finalidade das ferramentas de internet banking, há um abalo
nessas relações. Além do prejuízo financeiro da ordem de R$ 7,5 milhões,
comprovado até o momento, a importância da 'Operação Valentina'
consiste em restabelecer o patrimônio imaterial das relações de
confiança que restou abalado", afirmou.
Delano Bunn diz que, apesar da fraude detectada, o sistema do internet
banking é seguro. "É uma ferramenta segura, desde que mantidas as regras
básicas de proteção digital. O que uma quadrilha como essa provocou é
um percentual insignificante diante do número global de transações
bancárias realizadas todos os dias".
Fique por dentro
Xuxa já foi alvo de fraudes de três dos presos
A maioria dos integrantes do grupo tinha antecedentes criminais por
estelionato, uso de documento falso e falsidade ideológica. A reportagem
apurou com fontes que não fazem parte das investigações, que três
presos na 'Operação Valentina' - Arthur Franklin Sousa Lima, José Silva
Silveira Júnior e Michelângelo Charles Garcia - foram presos em 2008
pela Polícia Civil do Ceará, acusados de fazerem parte de um grupo de
hackers que agia em vários estados. Como noticiou à época o Diário do
Nordeste, alguns cartões foram apreendidos com a quadrilha, entre eles,
um em nome da apresentadora Maria da Graça Xuxa Meneghel. Na época, os
criminosos invadiram a conta da apresentadora, solicitaram um cartão e
colocaram José Silas como dependente.