Em pouco mais de um ano que os bairros Vicente Pinzón, Cais do Porto e
Mucuripe receberam a primeira Unidade Integrada de Segurança (Uniseg), o
piloto do projeto de policiamento que o Governo deseja expandir para
todo o Ceará, os Crimes Violentos Letais Intencionais (CVLIs) -
homicídios, latrocínios e lesões corporais seguidas de morte - caíram
consideravelmente na região, mas muitos moradores ainda desconhecem a
medida e continuam assustados com a violência e com o poder que o crime
organizado mantém na área.
Na Uniseg, uma Delegacia 24h da Polícia Civil e quartéis da Polícia
Militar e do Corpo de Bombeiros ficam responsáveis pela mesma área, que é
menor em relação às Áreas Integradas de Segurança (AISs).
O efetivo
policial não se restringe ao trabalho ostensivo, como é visto
normalmente nas ruas de todo o Estado, mas é treinado para realizar
ações comunitárias e de cidadania, junto à população.
De acordo com dados do Ceará Pacífico, os CVLIs caíram 69,7%, na região
da Uniseg 1, passando de 76 ocorrências, no acumulado de 2015, para 23,
em todo o ano de 2016. Porém, os números do início deste ano de 2017
começam a preocupar as autoridades: até o fim de março, foram dez mortes
na região, contra apenas sete em igual período do ano passado.
Já os Crimes Violentos contra o Patrimônio (CVP) - roubos - têm
reduzido neste ano, na região. Nos três primeiros meses de 2017, foram
registrados 92 casos, contra 140 em igual período de 2016, representando
uma queda de 34,3%. No ano passado, foram registrados pela Polícia 491
roubos, mas os dados do ano anterior (2015), não foram divulgados pelo
Governo.
Uma das principais incentivadoras das Unisegs, a vice-governadora do
Estado, Izolda Cela, pondera que a diminuição das mortes, no primeiro
ano da unidade piloto, não pode ser atribuída exclusivamente ao
programa. "É um dado animador. Com isso, eu não quero dizer que estamos
em uma situação confortável, mas são sinais promissores de que pode
estar acontecendo alguma coisa ali. Eu digo isso porque acho que um
projeto dessa natureza precisa ser testado pelo tempo. Inclusive porque
um dos objetivos é resgatar o nível de confiança que a comunidade tem na
Instituição".
Medo
O primeiro ano de implantação do policiamento comunitário, na região do
Vicente Pinzón, não foi suficiente para muitos moradores da região
perceberem diferenças ou melhorias nas ações da Segurança Pública.
O que assusta mais a professora Adriana Brandão, que trabalha em uma
escola do Vicente Pinzón, são os assaltos recorrentes. Ela tem que andar
a pé da parada de ônibus para o trabalho, e vice-versa, em ruas com
pouca movimentação durante o dia. "Você não pode andar com celular ou
bolsa. Sempre que eu venho para a parada de ônibus, fico perto de um
senhor que faz a segurança aqui, por medo", afirma, referindo-se ao
vigilante que é pago pela comunidade.
Para uma aposentada moradora do Cais do Porto, que nunca ouviu falar na
Uniseg, existe outro poder na região: o crime organizado, que impõe
suas próprias regras e é responsável por uma série de homicídios. "Quem
rouba aqui 'vai pro saco'. Eu me sinto bem segura porque se alguém
roubar é morto. Eu posso viajar, deixar minha casa aberta, que ninguém
rouba nada. A Polícia passa direto, mas vai embora e continua igual",
revela.
Há quem tenha medo até de falar sobre o assunto. "O negócio aqui é
complicado. O cidadão falar é perigoso. O Estado não dá segurança. Todos
os bairros são dominados pelos bandidos. Quando acontece alguma coisa, a
Polícia aparece, mas se não acontecer não aparece", diz um bombeiro
hidráulico morador do Mucuripe, que também nunca ouviu falar na Uniseg.
A única moradora que diz conhecer o projeto implantado pelo Governo na
região, entre os entrevistados, a chefe de cozinha Maria Eliete dos
Santos disse ter notado uma pequena melhora na segurança, mas reclama do
efetivo policial.
"No começo, tinha melhorado, mas apareceu uma nova demanda e os
policiais não estão demorando tanto aqui. Era necessário que houvesse
mais policiais. É preciso que o Governo se volte mais para a Segurança,
porque nós estamos a mercê dele e estamos trancados nas nossas casas",
reclamou Eliete Santos.
Expansão
Além da unidade piloto, já está funcionando a segunda Uniseg na
Capital, implantada nos bairros Aldeota, Varjota, Meireles e Praia de
Iracema, desde o dia 7 de julho do ano passado. As duas áreas foram as
primeiras escolhidas porque já haviam sido estudadas para receberem o
programa do Governo Federal 'Crack, é Possível Vencer', em 2014, segundo
a vice-governadora.
Conforme Izolda, a terceira Uniseg, que será instalada no dia 22 deste
mês, irá compreender os bairros Conjunto Ceará, Genibaú e Granja
Portugal. E a quarta unidade, prevista para junho, irá abranger Bom
Jardim, Granja Lisboa e Siqueira.
O plano do Governo é expandir as Unisegs para as demais regiões de
Fortaleza e para todo o Estado, mas as datas só serão divulgadas pela
Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS) posteriormente,
disse a vice-governadora. "Temos que fazer isso com responsabilidade. A
primeira turma dos aprovados do concurso da Polícia Militar, que já está
na academia, em formação, estarão prontos para serem nomeados no final
de agosto. A entrada de novos profissionais é essencial para organizar e
dar mais vigor à expansão da Uniseg", apontou.
A ampliação do novo modelo de policiamento, que se propõe mais
comunitário, enfrentará um cenário de aumento dos índices de violência
em Fortaleza e no Ceará. O mês de abril teve o pior registro de mortes
violentas no governo Camilo Santana (com 377 ocorrências no Estado),
desde o primeiro mês de mandato dele, janeiro de 2015.
No ano de 2017, já são três meses de avanço dos CVLIs, em comparação a
2016: em janeiro aumento de 8%, em março de 13,2% e em abril de 37,5%.
Na Capital, os assassinatos cresceram em todos os meses de 2017, em
relação a 2016. Em abril o aumento foi de 86,6%.