
SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Diretora do Departamento
de Homicídios da Polícia Civil de São Paulo, a delegada Elisabete Sato
disse nesta quinta-feira (9) que o Estado vive um período "muito
complicado" para a segurança pública e que até mesmo a Rota, a tropa de
elite da PM, não tem conseguido entrar em favelas da capital paulista.
Essa é a primeira vez que um integrante da cúpula da
Segurança Pública do governo Geraldo Alckmin (PSDB) admite haver
territórios controlados pelo crime, como ocorre no Rio de Janeiro.
Alckmin é pré-candidato à Presidência da República.
A delegada, uma das mais respeitadas da polícia e com
40 anos de carreira, falou sobre homicídios e latrocínios durante
evento do MPD (Ministério Público Democrático) em São Paulo. Também
participaram do encontro promotores, jornalistas e o comandante da
Polícia Militar na região central da cidade.
Aos presentes, Elisabete Sato disse que vivemos um
"caos social" que provocou mudanças na população e, em especial, nas
favelas paulistanas. Disse ainda que não será a polícia sozinha que
conseguirá resolver um problema social dessa magnitude -que passa por
todo o sistema da Justiça criminal, incluindo "legislações arcaicas".
"A realidade mudou. As favelas, as comunidades
mudaram. Nas últimas semanas tivemos o duplo homicídio das meninas [de
três anos] e para entrar lá naquela favela do Jardim Lapena [zona
leste], entramos porque foi homicídio. É muito complicado. A gente
precisa muito pensar nessas coisas", disse ela, em referência ao estupro
e assassinato de Beatriz Moreira dos Santos e Adrielly Mel Severo
Porto.
A delegada continuou. "Eu converso muito com nossos
investigadores. E nossos investigadores me falaram na semana passada:
'Diretora, está difícil entrar em Paraisópolis [...] Nem a PM nem a Rota
estão entrando lá'", disse.
PARAISÓPOLIS
Paraisópolis é uma das maiores favelas de São
Paulo e um dos principais redutos da facção criminosa PCC na capital. É
de lá que Francisco Antônio Cesário da Silva, o Piauí, ordenou em 2012 a
morte de PMs em São Paulo e que, no mesmo ano, levou a PM a ocupar a
comunidade.
Ainda de acordo com a delegada, além do crime
organizado a ser enfrentando, há um problema da própria forma como a
sociedade vê seus policiais. "A população odeia a sua polícia. Qualquer
lugar que a gente vá, a polícia é hostilizada. O que está acontecendo?",
disse.
Presente no mesmo evento e indagado sobre o
assunto, o coronel da PM Francisco Alves Cangerana Neto negou haver
áreas controladas por criminosos e repetiu a versão oficial sustentada
pelo governo."Posso afirmar aqui que a polícia entra em qualquer área em
São Paulo, tranquilamente. Evidentemente que tem locais que precisa ter
precaução com segurança", afirmou ele. "É óbvio que tem local que tem o
risco muito grande, por isso é preciso ter o ferramental adequado, as
táticas adequadas para entrar. Mas afirmamos aqui que entramos em
qualquer local em São Paulo."
As declarações levaram parte do público
presente ao evento a questionar se há o risco de São Paulo "tornar-se
"um Rio de Janeiro", com uma série de áreas controladas por criminosos
armados. "São Paulo não vai virar um Rio", disse o coronel. "Já respondi
essa pergunta 26 anos atrás. E volto a responder de novo: Não vai
acontecer em São Paulo", afirmou ele.
O presidente do Conseg (Conselho de
Segurança) do Portal do Morumbi, Celso Cavallini, disse que Sato tem
razão em suas afirmações. Disse que há determinados momentos e
circunstâncias que os carros da polícia, tanto Civil quanto Militar, não
entram na região. "Esses dias atiraram numa viatura da Rota que estava
perseguindo uma moto roubada."
Cavallini disse ainda que alguns policiais
evitam entrar na favela porque o risco de confronto é grande e os
policiais são transferidos de batalhão quando há mortes em confronto.
Em nota no início da noite, o secretário
Mágino Alves Barbosa Filho (Segurança Pública) reagiu à afirmação da
delegada da Polícia Civil. "A afirmação de que as polícias de São Paulo
têm dificuldade em cumprir seu trabalho, seja em comunidades ou em
qualquer outro lugar, é o mais completo absurdo." Ele cita operações e
prisões recentes na favela de Paraisópolis.
Também em nota, o comandante interino da PM,
coronel Mauro Ricciarelli, e o delegado-geral da Polícia Civil, Youssef
Abou Chahin, foram na mesma linha do secretário.
O líder comunitário Gilson Rodrigues também
afirmou que a delegada está equivocada em relação à realidade de
Paraisópolis que, segundo ele, é uma comunidade acolhedora e está muita
distante do cotidiano das favelas do Rio. "Aqui você não vê ninguém com
fuzis vendendo drogas. O governador vem tomar café aqui de 15 em 15
dias: como a polícia não vem?."