Por Natália André
São Paulo (SP) – Jair Bolsonaro (PSL) é o
42º presidente da República do Brasil com mais de 55% dos votos neste
domingo (28), dia de decisão do segundo turno das eleições. O capitão
reformado do Exército foi confirmado vencedor às 19h21 com 94,44% das
urnas apuradas e um número de mais de 55 milhões de votos. O petista
Fernando Haddad ficou para trás com menos de 45% dos votos. O resultado
já vinha sendo apontado por todas as pesquisas de intenção de voto do
segundo turno.
E agora?
A reportagem conversou com um filósofo político e um sociólogo para tentar entender ou prever como será o Brasil de 2019 com o novo presidente. E as opiniões dão conta da resolução da crise econômica e política em que o país se encontra, o fim da polarização e da revolta entre os brasileiros e do medo de retrocesso social.
“A polarização aumentou demais as expectativas das pessoas”
Para o professor Luiz Bueno, filósofo político da FAAP (Faculdade Armando Alvares Penteado), o discurso radical e violento do capitão reformado do Exército vai ter que mudar e amenizar, afinal, ele vai governar para todo o Brasil e, mesmo ganhando, uma grande parte do país votou contra ele.
“Muita gente conseguiu a validação moral de atos inaceitáveis que
pensavam com as palavras de Bolsonaro”, comenta, justificando o
encorajamento para que pessoas cometessem essas agressões que tivemos
relatos. “Todos eram adultos e têm responsabilidade, mas houve peso
político sim”, conclui.
Para o professor, o término da campanha vai fazer os ânimos
“arrefecerem”. Porém, se Bolsonaro não atender as expectativas
altíssimas dos seus eleitores, a população volta a se irritar e, dessa
vez, unida. “Pelo histórico brasileiro, a frustração com o governo vem
tão rápido quanto a expectativa, e logo vem o desânimo também. Ou
Bolsonaro constrói uma visão grande de estadista, ou o povo volta a se
unir, mas para criticá-lo”, afirma.
O discurso de Bolsonaro, para Luiz Bueno, mostra que ele conseguiria
resolver tudo muito rápido e facilmente, já que a confiança cresceu com
os resultados para o Congresso no primeiro turno, mas não é bem assim.
“É muito mais difícil quanto parece, ainda mais para alguém que nunca
passou pelo Executivo. Ele vai ter que trabalhar para manter a base ao
seu lado. Não basta apenas uma bancada grande do próprio partido”,
finaliza.
“A estabilidade do Governo necessita da estabilidade na rua”
O professor e sociólogo da FESPSP (Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo), Paulo Silvino Ribeiro, é critico ao governo de Bolsonaro por pensar que é o caminho mais distante para a democracia. “Até ele tem dificuldade de explicar suas propostas, então, não dá para dizermos como vai ser. Tudo indica que será um retrocesso para as ‘maiorias populacionais’ que são, na verdade, ‘minorias eleitorais’, ou seja, negros, mulheres e população LGBTQI+”, reforça.
Apesar das discussões sobre a nova economia brasileira do guru do
capitão reformado do Exército, Paulo Guedes, e do seu vice, general
Hamilton Mourão, as propostas ainda são confusas. Porém, tem um ponto
tão fundamental quanto esse, o social. “O eleitorado de Bolsonaro não
está convencido que questões humanas são fundamentais. Aqui, no Brasil,
temos a cultura do “você sabe com quem está falando” e encontraram em um
líder político forte, grande, o eco desse pensamento. Ele vai levar
para dentro do Estado a naturalização das desigualdades”, preocupa-se o
professor.
Para Silvino, outro ponto importante de se discutir, é o desejo das
pessoas de um governante autoritário. “Fiz uma viagem à Ribeirão Preto,
interior do estado de São Paulo, cidade onde o PT foi muito presente nas
gestões da Prefeitura, e encontrei, em um posto de gasolina, um cartaz
escrito o seguinte: ‘Levanta-te, capitão, o Brasil precisa de você’.
Levante-te, capitão. As pessoas querem um capitão para recuperar a
democracia que elas acham que se perdeu com a corrupção do PT”, conclui.
Na pesquisa Datafolha do dia 17 de outubro, já entre os primeiro e
segundo turnos, 76% dos eleitores evangélicos achavam que Bolsonaro era o
candidato mais autoritário, mas, ao mesmo tempo, para 57% desse mesmo
grupo, o ex-deputado federal era o que mais defendia a democracia.
Vale lembrar que governos autoritários, historicamente, não foram
democráticos, ou seja, não ouviam e respeitavam a voz da população, do
coletivo, das ruas. Aqui no Brasil, durante a Ditadura Militar
(1964–1985), por exemplo, pessoas foram exiladas, torturadas e mortas
por se manifestarem contra o governo. Um dos ídolos do nosso novo
presidente, coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, morto em 2015, foi
condenado por torturar pessoas no período inclusive.
Ainda pela ótica do sociólogo, Bolsonaro tem uma característica que
outros governantes tinham e fizeram diferença: “a natureza messiânica”.
Além de ter o “Messias” no próprio nome, ele surge como uma figura
diferente, deslocada do que já foi visto, no meio de uma crise econômica
e política e com muitas promessas para salvar o Brasil. “Já tivemos
Getúlio Vargas, que tinha um discurso forte contra o comunismo; Jânio
Quadros; e até mesmo a Ditadura que, sim, teve apoio popular e não
podemos esquecer disso”, questiona.
Paulo também fala sobre o perigo da “confusão conceitual das funções”
que existe. Para ele, o brasileiro não sabe direito o que faz cada
governante e cobra, portanto, de foram errada. Como, por exemplo,
eleitor que acreditou em discurso de candidato ao governo que disse que
vai acabar com “saidinha de preso”. Os únicos que podem mexer nisso são
os deputados e os senadores, depois de um projeto de lei votado,
aprovado e chancelado pelo presidente.
“A possibilidade de impeachment existia para ambos”
As análises de Paulo e Luiz se combinam justamente na questão “a polarização vai acabar?”. Positivos, eles acreditam que sim. Mas em um ponto: no descontentamento com o governo. Não que acreditam que o governo de Bolsonaro vai dar errado, não é isso, mas os dois acreditam que a possibilidade de um impeachment existia para ambos.
Primeiro, porque se o governo não corresponde ao esperado, e as
expectativa estão altas, quem não gostava de Bolsonaro, passa a rejeitar
mais; quem sonhava com o seu governo, sente-se traído por tantas
promessas em vão. Segundo Paulo, é a ordem do “inimigo em comum”. Já
para Luiz, quando a campanha acaba, as pessoas voltam para a vida
normal, olham para o cotidiano, para a vida real e entendem que o embate
político não é a parte mais relevante. As relações do cotidiano são
relações reais”, conclui.
História
Jair Bolsonaro nasceu em Campinas, interior paulista, em 21 de março de 1955. É filho de Percy Geraldo Bolsonaro, que trabalhava como dentista e morreu em 1995, e Olinda Bonturi Bolsonaro, dona de casa de 89 anos.
Em 1977, formou-se pela Academia Militar das Agulhas Negras e serviu o
Exército por três anos. Em junho de 1988, foi para a reserva com a
patente de capitão. Logo em seguida, ingressou na política.
Exerceu seu primeiro cargo eletivo como vereador do Rio de Janeiro
pelo Partido Democrata Cristão (PDC), mas não concluiu o mandato. Em
1990, se afastou do cargo para se candidatar a deputado federal. Com
discurso conservador, foi eleito, e, a partir dali, permaneceu na Câmara
por mais outras seis legislaturas: de 1995 a 2018. Na eleição de 2014,
foi o candidato mais votado do Rio, com mais de 464 mil votos.
Até chegar ao PP, partido onde permaneceu por 11 anos, passou por uma
série de legendas. Em março deste ano, se filiou ao PSL com o objetivo
de disputar a Presidência da República
Bolsonaro liderava as pesquisas de intenção de votos desde o início
do ano, mas apenas em cenários testados sem a presença do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva — inicialmente registrado como o
presidenciável do PT. Após o TSE indeferir a candidatura do petista, com
Fernando Haddad assumindo o posto, Bolsonaro esteve no topo em todos os
outros levantamentos realizados até então, apesar da alta taxa de
rejeição.
Com um discurso conservador e antipetista, Bolsonaro conquistou o
eleitorado ao defender a manutenção da família tradicional e com um
forte discurso na questão da segurança pública, considerado um dos
principais problemas do Brasil. Na economia, afirma ser um liberal,
embora não tenha dado detalhes de suas propostas. Ele escolheu o
economista Paulo Guedes para coordenar seu plano na área.
O candidato do PSL levou uma facada no dia 6 de setembro durante ato
de campanha em Juiz de Fora (MG). Ele foi levado à Santa Casa da cidade,
onde foi submetido a uma cirurgia pelo SUS. No dia seguinte, foi
transferido para o Hospital Albert Einstein, em São Paulo, onde passou
por novos procedimentos. O capitão da reserva ficou o restante do mês em
recuperação e recebeu alta no dia 29 de setembro.
O agressor Adélio Bispo de
Oliveira tornou-se réu na última semana pelo crime. Ele foi denunciado
por atentado pessoal decorrente de inconformismo político. Segundo o
Ministério Público Federal, o acusado colocou em risco o regime
democrático ao tentar interferir no resultado das eleições por meio do
assassinato de um dos concorrentes na disputa eleitoral. A Polícia
Federal concluiu no primeiro inquérito que Adélio agiu sozinho, mas
segue investigando o caso.
Com colaboração de Juliana Arreguy e Stella Borges.