O menino de 12 anos que sobreviveu à maior chacina do Ceará,
no clube "Forró do Gago", no Bairro Cajazeiras, se fingiu de morto ao
levar o primeiro tiro na coxa. Outra criança que ajudava o pai na venda
de lanches foi baleada e ameaçada, segundo relato de uma moradora da
comunidade. A testemunha também contou que outros sobreviventes, entre
eles mulheres grávidas, pularam muros e se esconderam embaixo do palco
para escapar dos atiradores.
A
reportagem encontrou alguns comércios fechados, casas vizinhas
anunciando a venda dos imóveis e moradores que preferiam ficar dentro
das casas; alguns relataram medo. A família do menino de 12 anos
sobrevivente do caso, filho do vendedor de cachorro-quente conhecido
como Marrom, morto no local, foi embora do bairro.
14 mortes
A
chacina ocorreu na madrugada deste sábado (27), quando criminosos,
supostamente integrantes de uma facção, chegaram ao clube atirando. Ao todo, 14 pessoas foram mortas. A maioria mulheres. O caso é tratado como a maior chacina do Ceará.
Uma
moradora da comunidade que não quis ser identificada conversou com o G1
e afirmou que o grupo autor do crime pertence a uma facção, e chegou ao
local dividido em três carros e duas motos. Entre eles havia mulheres, e
todos tinham os rostos cobertos, usavam roupas pretas, coletes e
armamento pesado, incluindo fuzis, segundo a moradora.
'Atirando pra tudo quanto era lado'
"Não
citaram nome de ninguém, foram atirando pra tudo quanto era lado, sem
querer saber se era criança que tava na calçada, foi total terror. Até
as crianças foram ameaçadas por eles. Não foi só no Forró do Gago que
eles chegaram amedrontando todo mundo, foi no bairro todo, andaram rua
por rua atirando sem rumo", conta a mulher.
Conforme
o relato da testemunha, uma criança sobrevivente foi baleada e ameaçada
pelos criminosos. "A criança no chão, eles disseram assim: 'tu só não
vai ser morto porque as balas acabaram'. Isso é coisa que se faça?".
A
testemunha diz ainda que vive no local desde que nasceu e nunca tinha
presenciado situação parecida. "Nunca tinha visto nada igual", afirma.
"Ainda
vem dizer que não é pra gente ficar amedrontado, com trauma. Como a
gente não vai ficar, se a gente tem filho, tem mãe, pai, irmão, que não
são envolvidos, são cidadãos", diz a moradora da comunidade,
referindo-se à declaração dada pelo secretário de Segurança do Ceará,
André Costa, no dia do massacre, alegando que "não há motivo para pânico
e temor".
O govenador do Ceará,
Camilo Santana, afirmou que a polícia montou uma força-tarefa para
prender os suspeitos da chacina. Uma pessoa foi presa com um rifle, e
cinco foram identificadas, entre elas dois mandantes do massacre.
O
Ministério da Justiça informou que montará uma força-tarefa para
contribuir com o Governo do Ceará nas investigações sobre a chacina. A
equipe enviada pelo Ministério contará com membros da Secretaria
Nacional de Segurança Pública, Polícia Federal, Polícia Rodoviária
Federal e Departamento Penitenciário Nacional.
O
Ceará vem registrando índices recordes de violência, com 5.134
homicídios em 2017. Segundo o governador Camilo Santana, 84% dessas
mortes são decorrência da guerra entre facções criminosas.