A liminar deferida pelo juiz federal Waldemar Cláudio de Carvalho
na sexta-feira (15), no Distrito Federal, que permite aos psicólogos
oferecerem tratamento contra homossexualidade tem repercutido e causado
revolta. O Conselho Federal de Psicologia
(CFP) divulgou uma nota em que se posiciona contra a decisão da Justiça
Federal e afirma que irá recorrer. Além disso, grupos ativistas LGBT,
como o Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual e de Gênero e a Aliança Nacional LGBT afirmaram que ingressarão no processo para reverter a decisão.
Como apontam especialistas ouvidos pelo Justificando,
a decisão atenta contra os Direitos Humanos, além de princípios éticos
profissionais da profissão de psicólogo, como fica nítido na Resolução
01/1990 do CFP, em que foi acordado que profissionais da área “não
exercerão qualquer ação que favoreça a patologização de comportamentos
ou práticas homoeróticas, nem adotarão ação coercitiva tendente a
orientar homossexuais para tratamentos não solicitados”. Deste modo, o conselho de ética proíbe qualquer ação discriminatória que sugira algum tipo de “cura” para homossexuais.
Ainda de acordo com o a resolução,
“os psicólogos deverão contribuir, com seu conhecimento, para uma
reflexão sobre o preconceito e o desaparecimento de discriminações e
estigmatizações contra aqueles que apresentam comportamentos ou práticas
homoeróticas”.
Entretanto,
apesar de ser algo que já há muito foi superado pelos debates em
direitos humanos e pela medicina – vale dizer que a Organização Mundial
de Saúde (OMS) retirou a homossexualidade da lista de doenças em 1990 – o
juiz suspendeu em liminar os efeitos da Resolução 01/1990, ao alegar
que a proibição de atuar em favor da “cura gay” atentaria contra a
liberdade profissional dos psicólogos.
O caso despertou intensa revolta. Ao Justificando, o Doutor em Direito Constitucional, Professor na Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP), Alexandre Bahia, afirmou que a decisão do juiz é absurda e retoma conceitos há muito ultrapassados:
“Essa
decisão é absurda: ela retoma conceitos já há muito superados, seja
aqui seja fora do País. Falar em permissão de tratamento para pessoas
homossexuais usando a desculpa da “egodistonia” distorce conceitos, mais
uma vez, há muito debatidos e definidos. (…)
O
juiz que deu a liminar parece desconhecer as dúzias de Normas de
Direito Internacional – seja OEA, ONU, OPAS/OMS que, reiteradamente, têm
falado contra terapias de ‘cura’ da homossexualidade. Associações
Médicas e de Psicologia, do Brasil, dos EUA, da Europa, etc., há anos
reúnem centenas de pesquisas e artigos mostrando que tais terapias são
não apenas enganosas mas desastrosas para os que a ela são submetidos” afirmou o professor.
O Professor Doutor de Direito na Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), Renan Quinalha, em seu perfil no Facebook criticou a decisão e afirmou que acionará o Conselho Nacional de Justiça contra o magistrado: “Depois
de décadas de luta pela despatologização, ressuscita-se o discurso da
cura de uma doença. A decisão (…) é exemplo perfeito disso. Vamos
denunciar o juiz ao CNJ e divulgar bastante esta notícia absurda. A
farra do Judiciário conservador que decide contra a lei precisa acabar” afirmou.
A Advogada, Mestre em Direito pela PUC/SP e co-fundadora da Rede Feminista de Juristas, Mariana Serrano, também discordou da decisão, a qual qualificou como “gravíssima” – “eleger
a ‘manutenção a liberdade de pesquisa’ em detrimento da vedação a
práticas de tortura física e psicológica e estigmatização de toda uma
parcela populacional importa em violação gravíssima aos direitos
humanos” – afirmou.
Mariana lembrou ainda dos efeitos da decisão para quem é constantemente invisibilizado no debate LGBT, como pessoas bissexuais:“outro
fator relevante, é que a forma como essa informação tem sido veiculada
pela mídia reproduz o apagamento da bissexualidade, ironicamente na
semana da visibilidade bissexual. Pessoas bissexuais também são
estigmatizadas com a patologização de orientações não-heterossexuais, e a
mídia tem falhado lembrar que existimos” completou.
No Twitter repercutiu a hashtag #HomofobiaÉDoença, a qual até o momento da publicação da matéria estava em primeiro lugar nos trending topics mundiais.