O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se preparou
longamente para prestar seu primeiro depoimento como réu em um processo
aberto desde o início da Lava Jato. Mas, quando entrou na sala de
audiência da 10ª Vara Federal de Brasília, às 10h11 desta terça-feira
(13), Lula parecia bastante nervoso.
Vestindo
terno escuro, camisa lilás e sua habitual gravata com as cores da
bandeira do Brasil, Lula tirava e colocava a tampa da caneta azul que
estava nas suas mãos, passava a língua sobre os lábios secos e penteava o
bigode com o dedo indicador direito. Quem o conhece sabe que esses são
sinais particulares do nervosismo do petista.
Logo
nos primeiros minutos do depoimento, Lula fez um desabafo e afirmou que
acordava todos os dias com medo de jornalistas estarem na porta de seu
apartamento, em São Bernardo do Campo (SP), esperando sua prisão.
"O
senhor não sabe como é acordar todo dia com medo de a imprensa estar na
sua porta, achando que você vai ser preso", disse Lula ao juiz Ricardo
Augusto Soares Leite. Segundo o ex-presidente, há uma "perseguição"
contra ele nas investigações que apuram o esquema de corrupção da
Petrobras, e há alguém "instigando" que delatores falem seu nome nos
acordos de colaboração com a força-tarefa da Lava Jato.
Lula
foi questionado sobre sua profissão: "torneiro mecânico", retrucou. E,
sobre sua renda líquida mensal, disse que recebe aposentadoria, no valor
de "uns R$ 6 mil", mais benefícios de sua mulher, Marisa Letícia, que
morreu no mês passado, em decorrência de um AVC.
"Acho
que pode botar uns R$ 50 mil, estou tentando chutar", disse Lula.
"Depois, meu advogado manda para os senhores direitinho".
Lula
estava acompanhado dos advogados José Roberto Batochio, ex-presidente
nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), além de Roberto
Teixeira, Cristiano Zanin e Sigmaringa Seixas. O juiz proibiu fotografar
ou filmar o réu na sala de audiências e na sala em que a imprensa
acompanhava o depoimento por dois monitores de vídeo.
Questionado
sobre o andamento da Lava Jato e supostas conversas que poderiam ter o
objetivo de influenciar nas investigações, Lula afirmou: "Da Lava Jato,
falamos no café da manhã, no almoço, no jantar e, às vezes, até depois
da novela", afirmou o ex-presidente.
Lula
se tornou alvo do processo no qual prestou depoimento nesta terça após
ser citado pelo ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) e do ex-diretor
da Petrobras Nestor Cerveró, em acordos de delação premiada. Ele é
acusado de tentar dissuadir Cerveró de fechar a colaboração com a
Justiça.
'MASSACRE'
Após os primeiros vinte minutos de depoimento, Lula parecia um pouco mais tranquilo.
Fez
discurso político, disse que, com seu governo, o Brasil chegou "quase" a
ser a quinta economia do mundo e que conversa e é "amigo" de "todos os
partidos políticos".
No
fim do depoimento, Lula se emocionou ao relatar episódio em que um juiz
de São Paulo riu quando um advogado chamou o ex-presidente de "doutor",
justificando que o petista tinha o título de honoris causa.
"Eu
quero defender a minha honra, é o valor mais importante que eu tenho",
disse Lula. "Eu aprendi a andar de cabeça erguida. Para quem nasce na
elite, não precisa de nada. Mas quem vem debaixo, não deixar colocar
cangalho no seu pescoço, não é fácil", finalizou o ex-presidente.
Durante
o depoimento, o ex-presidente disse que é "vítima quase que de um
massacre" no caso Lava Jato. Ele negou a acusação de Delcídio do Amaral
(ex-PT-MS) de que teria tentado interferir na delação de Cerveró. "Os
dados são falsos", disse Lula.
Sobre as acusações de Delcídio, o ex-presidente afirmou que não temia uma delação de Cerveró.
"Doutor
[juiz], só tem um brasileiro que podia ter medo de um depoimento do
Cerveró, pela relação dele, que é o Delcídio. Eu não tinha relação com o
Cerveró. Eu não tive medo. O Delcídio contou uma inverdade nesse
processo", disse Lula.
Indagado
sobre a motivação de Delcídio em dizer uma suposta mentira, Lula disse
que pode ter sido por tê-lo chamado de "imbecil" quando veio à tona a
gravação em que o então senador disse que iria procurar ministros do STF
(Supremo Tribunal Federal) para tentar soltar Cerveró.
"Não
sei o que o Delcídio resolveu fazer com isso [delação], certamente
depois de presos alguns dias, a pessoa resolve jogar a culpa nos outros.
Eu tive uma reação que eu sei que ele não gostou. [Disse na época]
'Esse cara é um imbecil, nem na morte você citaria um ministro da
suprema corte'. Ele ficou chateado porque eu o chamei de imbecil",
afirmou o ex-presidente.