quarta-feira, 15 de março de 2017

Lula diz sofrer 'massacre' e que acorda sabendo que esperam sua prisão

Lula chega para depoimento

 O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva se preparou longamente para prestar seu primeiro depoimento como réu em um processo aberto desde o início da Lava Jato. Mas, quando entrou na sala de audiência da 10ª Vara Federal de Brasília, às 10h11 desta terça-feira (13), Lula parecia bastante nervoso.

Vestindo terno escuro, camisa lilás e sua habitual gravata com as cores da bandeira do Brasil, Lula tirava e colocava a tampa da caneta azul que estava nas suas mãos, passava a língua sobre os lábios secos e penteava o bigode com o dedo indicador direito. Quem o conhece sabe que esses são sinais particulares do nervosismo do petista.

Logo nos primeiros minutos do depoimento, Lula fez um desabafo e afirmou que acordava todos os dias com medo de jornalistas estarem na porta de seu apartamento, em São Bernardo do Campo (SP), esperando sua prisão.

"O senhor não sabe como é acordar todo dia com medo de a imprensa estar na sua porta, achando que você vai ser preso", disse Lula ao juiz Ricardo Augusto Soares Leite. Segundo o ex-presidente, há uma "perseguição" contra ele nas investigações que apuram o esquema de corrupção da Petrobras, e há alguém "instigando" que delatores falem seu nome nos acordos de colaboração com a força-tarefa da Lava Jato.

Lula foi questionado sobre sua profissão: "torneiro mecânico", retrucou. E, sobre sua renda líquida mensal, disse que recebe aposentadoria, no valor de "uns R$ 6 mil", mais benefícios de sua mulher, Marisa Letícia, que morreu no mês passado, em decorrência de um AVC.
"Acho que pode botar uns R$ 50 mil, estou tentando chutar", disse Lula. "Depois, meu advogado manda para os senhores direitinho".

Lula estava acompanhado dos advogados José Roberto Batochio, ex-presidente nacional da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), além de Roberto Teixeira, Cristiano Zanin e Sigmaringa Seixas. O juiz proibiu fotografar ou filmar o réu na sala de audiências e na sala em que a imprensa acompanhava o depoimento por dois monitores de vídeo.

Questionado sobre o andamento da Lava Jato e supostas conversas que poderiam ter o objetivo de influenciar nas investigações, Lula afirmou: "Da Lava Jato, falamos no café da manhã, no almoço, no jantar e, às vezes, até depois da novela", afirmou o ex-presidente.

Lula se tornou alvo do processo no qual prestou depoimento nesta terça após ser citado pelo ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) e do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, em acordos de delação premiada. Ele é acusado de tentar dissuadir Cerveró de fechar a colaboração com a Justiça.

'MASSACRE'

Após os primeiros vinte minutos de depoimento, Lula parecia um pouco mais tranquilo.
Fez discurso político, disse que, com seu governo, o Brasil chegou "quase" a ser a quinta economia do mundo e que conversa e é "amigo" de "todos os partidos políticos".
No fim do depoimento, Lula se emocionou ao relatar episódio em que um juiz de São Paulo riu quando um advogado chamou o ex-presidente de "doutor", justificando que o petista tinha o título de honoris causa.

"Eu quero defender a minha honra, é o valor mais importante que eu tenho", disse Lula. "Eu aprendi a andar de cabeça erguida. Para quem nasce na elite, não precisa de nada. Mas quem vem debaixo, não deixar colocar cangalho no seu pescoço, não é fácil", finalizou o ex-presidente.

Durante o depoimento, o ex-presidente disse que é "vítima quase que de um massacre" no caso Lava Jato. Ele negou a acusação de Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) de que teria tentado interferir na delação de Cerveró. "Os dados são falsos", disse Lula.
Sobre as acusações de Delcídio, o ex-presidente afirmou que não temia uma delação de Cerveró.

"Doutor [juiz], só tem um brasileiro que podia ter medo de um depoimento do Cerveró, pela relação dele, que é o Delcídio. Eu não tinha relação com o Cerveró. Eu não tive medo. O Delcídio contou uma inverdade nesse processo", disse Lula.

Indagado sobre a motivação de Delcídio em dizer uma suposta mentira, Lula disse que pode ter sido por tê-lo chamado de "imbecil" quando veio à tona a gravação em que o então senador disse que iria procurar ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) para tentar soltar Cerveró.

"Não sei o que o Delcídio resolveu fazer com isso [delação], certamente depois de presos alguns dias, a pessoa resolve jogar a culpa nos outros. Eu tive uma reação que eu sei que ele não gostou. [Disse na época] 'Esse cara é um imbecil, nem na morte você citaria um ministro da suprema corte'. Ele ficou chateado porque eu o chamei de imbecil", afirmou o ex-presidente.