Em junho de
1997, a cearense Liduina deu à luz os filhos gêmeos que não tinha
condições de criar. Moradores da comunidade do bairro Padre Andrade, na
periferia de Fortaleza, ela e o companheiro, pai dos dois meninos
idênticos, tomaram então a difícil decisão de separar as crianças poucos
dias após o nascimento, em 25 de junho.
Adotados
por famílias diferentes, uma na capital cearense, e outra em Uberaba
(MG), Tomaz Maranhão e Gabriel Ferreira ficaram sem notícias um do outro
durante mais de duas décadas, reencontrando-se, virtualmente, somente
neste mês de junho, 23 anos depois.
A pista
principal para unir os irmãos nesta fase adulta, em que,
coincidentemente, ambos atuam como fotógrafos, foi uma fotografia. Aos
16 anos, Tomaz, adotado por Socorro Maranhão, foi apresentado a sua mãe
biológica, e dela ganhou este rastro.
“Nos
encontramos na minha casa. Foi bem forte pra mim, pois foi a primeira
vez que eu vi alguém tão parecido comigo. Ganhei dela dois presentes: o
nome e a foto do aniversário de um ano do meu irmão, que ela recebeu da
pessoa que o levou. Ela foi muito importante nessa busca, por me dar
nome e rosto de quem estava com ele”, lembra o cearense, que trabalha
como assessor da coordenação geral do Museu da Fotografia Fortaleza.
Buscas
Ao longo
dos anos, inúmeras foram as vezes que Tomaz utilizou as redes sociais
para procurar o irmão, mas em nenhuma teve sucesso. Até que no dia 1º de
junho de 2020, ele teve um “insight”: atrás da fotografia que havia
ganho de Liduina, havia o nome da mãe adotiva de Gabriel. E foi por este
dado que ele resolveu reiniciar as buscas no Facebook. Em menos de 30
minutos, localizou o perfil de Vanda, após filtrar por cidade e
identificação nominal.
“Meu
coração parecia saltar do peito, eu suava, até que vendo as fotos dessa
senhora, me encontrei, me vi numa imagem com um senhor, do lado de um
fusca. Eu entrei em pânico, pois não acreditava que aquilo estava
acontecendo e que eu era tão parecido com ele. E ele comigo”, relata
Tomaz. O contato com a família adotiva do irmão se deu por intermédio de
uma policial civil, Nivia, que falou com Vanda antes dele.
Gabriel,
por sua vez, que não tinha nenhuma pista do irmão até esta data, ficou
sabendo que ele o havia encontrado por meio de uma ligação da mãe
adotiva durante o expediente. “Para mim, foi um grande choque, tive que
me sentar e parar para raciocinar o que estava acontecendo. Minha cabeça
ficou a um milhão e eu não conseguia acreditar nisso. Entrei em contato
com ele pelo Facebook, e fomos para o WhatsApp”, relata.
Reencontro virtual
A primeira
chamada de vídeo dos gêmeos foi no intervalo do trabalho de Gabriel.
“Não sabíamos o que fazer nem o que falar um para o outro. Ficamos
chocados com a nossa semelhança e confesso que estava um pouco assustado
com ela. Mas foi um misto de sentimentos tão grande que eu me sentia
anestesiado e com uma paz interior, um alívio enorme, e surpreso por ter
acontecido tão cedo”, partilha.
De lá para
cá, o contato entre os dois se intensificou. Os gêmeos têm passado
várias horas da madrugada conversando, quase todos os dias. Já tiraram
de 21h30 às 9h só se atualizando de tudo que a distância os privou
nesses anos todos.
A paixão
comum pela fotografia, então, foi uma das melhores descobertas. “Meu
choque foi maior quando vi a foto dele vestido com roupa social e câmera
pendurada no pescoço. Não acreditei, e me choco até hoje. Foi ali que
realmente vi que a fotografia não estava à toa na minha vida”, detalha
Tomaz.
Trabalhar
com a imagem foi um escape de uma época complicada da vida de Gabriel,
na qual surgiram vários questionamentos sobre sua existência, além de
alguns problemas financeiros. Nesse período, ele chegou a desenvolver
uma marca própria para trabalhar em eventos, casamentos e fotografia de
casais. Mas hoje traz mais isso como um hobbie, enquanto concilia um
emprego numa farmácia e alguns cursos na área automotiva. Já Tomaz,
iniciou seu percurso fotográfico quando estava no Ensino Médio, e desde
então fez disso seu objetivo profissional.
Esperança
O
reencontro dos dois com a mãe biológica, Liduina, por videochamada,
também já aconteceu. “Fiquei muito feliz em poder estar vendo quem me
gerou e conhecer a minha raiz. Pedi que ela sentisse paz em seu coração,
pois o ato de nos entregar para a adoção foi heróico, e mostrou que
realmente queria nos ver bem e com saúde, como o sentimento de qualquer
mãe que ama seus filhos”, reconhece Gabriel.
Agora, os
irmãos acalentam o sonho do abraço presencial, que ainda não foi
possível devido ao contexto de pandemia do novo coronavírus. “A minha
vida inteira senti falta de mim mesmo, era um sentimento de perda. O
achado do Gabriel me deu um novo ar de vida. Me fez ver que mesmo diante
de toda situação crítica e triste que nos encontramos, há esperança.
Nosso maior sonho agora é sentir o poder do nosso abraço. Poder
materializar o nosso encontro. Sentir nossos corações que foram gerados
juntinhos, mas que por situações da vida foram separados”, aspira Tomaz.
Em meio a
esta crise humanitária, Gabriel acredita que o irmão o ajudou a tornar
esse ano o melhor de toda a vida. “Este aniversário será inesquecível
para mim, pois foi o maior e melhor presente que eu poderia receber”,
conclui.