Uma série de fraudes em saques e
pagamentos com recursos do auxílio emergencial já leva a Caixa a amargar
um prejuízo de mais de R$ 60 milhões, segundo apurou o
Estadão/Broadcast.
Falhas na poupança digital e no aplicativo "Caixa
Tem", entre outras brechas, têm permitido que criminosos acessem as
contas dos beneficiários e usem o dinheiro que não lhes pertence. O
valor do desfalque seria suficiente para pagar a cota de R$ 600 do
benefício a mais 100 mil brasileiros.
A instituição detectou que algumas contas estão sendo acessadas indevidamente,
por pessoas que não são as beneficiárias do auxílio. Como o calendário
de saques impôs restrições, os fraudadores têm ampliado sua forma de
atuação e usam o dinheiro para quitar boletos, fazer pagamentos com QR
code (uma espécie de código de barras) ou utilizam o cartão virtual da
poupança digital.
Diante das reclamações, a Caixa tem reembolsado os
beneficiários que foram vítimas do golpe, mas precisará arcar com o
prejuízo. O problema ocorre depois de a Caixa decidir abrir contas de
poupança digital para todos os beneficiários, inclusive aqueles que
haviam indicado contas já existentes para receber o benefício, e levou a
um jogo de empurra nos bastidores do banco. Nenhuma área quer assumir a
responsabilidade pelas perdas.
A professora de música Rafaela Priscila Cavalcanti da Silva, de 31
anos, recebeu normalmente a primeira parcela do auxílio em sua conta
poupança na Caixa, mas só ficou sabendo depois que a segunda prestação
havia sido depositada na poupança digital. Quando
tentou fazer o cadastro no Caixa Tem, no início deste mês apareceu a
informação de que o CPF já estava cadastrado com outro e-mail e
telefone.
Moradora de Camaçari (BA), Rafaela foi à agência da Caixa e descobriu que os fraudadores usaram
o dinheiro do seu auxílio para pagar um boleto de R$ 600. A professora
fez a contestação e após dez dias, conseguiu reaver os recursos. Até lá,
no entanto precisou atrasar contas. "Foi um prejuízo", diz. Prestes a
receber a terceira parcela, tem medo de a história de repetir. "Ainda
acho que não é confiável."
A ajudante de cozinha Aparecida Zilma, de 34 anos, levou um susto
quando foi sacar o dinheiro da segunda parcela do auxílio em 19 de maio.
"O atendente falou que eu já tinha sacado", conta. Beneficiária do
Bolsa Família, ela tentou retirar o dinheiro diretamente no caixa de uma
agência em Mauá (SP) porque seu cartão estava com problema e acabou ouvindo que ele havia sido clonado. "Retiraram o dinheiro em Minas Gerais", diz.
Aparecida levou mais de 30 dias para ser reembolsada
pela Caixa: só recebeu o valor sacado indevidamente junto com a
terceira parcela, agora em junho. Ela, que perdeu o emprego informal
durante a crise, já vinha atrasando algumas contas para conseguir
comprar comida e acabou ficando em situação ainda mais delicada. Para
segurar as pontas, Aparecida precisou da ajuda do companheiro, Joélio,
que trabalha como entregador e até hoje está com o seu pedido de auxílio
emergencial em análise.
Procurada, a Caixa informou que "atua com inteligência, prevenção e
combate a fraudes e adota as melhores práticas e ferramentas de mercado
para proteção de suas aplicações de forma a proteger seus clientes e
beneficiários". Segundo o banco, as áreas de segurança realizam
monitoramento e mapeamento contínuo de seus sistemas, em colaboração com
os órgãos de segurança, com o objetivo de coibir movimentações indevidas. "Eventuais ocorrências identificadas são tratadas e reportadas à Polícia Federal", diz a nota.
Crédito indevido
A Caixa também está acumulando prejuízos devido a um
erro de processamento que levou o banco a depositar o valor do auxílio
em dobro para alguns beneficiários. Mesmo quem indicou conta em outro
banco para receber o benefício recebeu a segunda parcela em uma poupança
digital criada automaticamente pela Caixa. Após um período, o dinheiro
que não havia sido gasto foi transferido dessa poupança para a conta
indicada originalmente.
Segundo apurou a reportagem, dentro da Caixa há quem defenda que o valor pago a mais seja
descontado da terceira parcela, mas o jurídico do banco é contra porque
poderia gerar questionamentos. Na aprovação da lei do auxílio, o
Congresso previu que o dinheiro da política é completamente blindado de
descontos por cobrança de dívidas, incluindo cheque especial.