As medidas anunciadas pelo governo federal para reduzir o preço do
diesel e alongar o intervalo de reajuste do combustível ainda não se
mostraram eficazes. Nas estradas de todo o País, muitos caminhoneiros
mantêm a paralisação, que chega hoje ao seu 9º dia, expondo fragilidades
do governo e golpeando o processo de retomada da economia brasileira.
Se nos últimos meses o País dava leves sinais de recuperação econômica,
apesar do desemprego ainda elevado e do aprofundamento da desigualdade
social, agora fica a incerteza sobre o tamanho dos prejuízos na economia
e o tempo necessário para revertê-los. No Ceará, os impactos atingem
diversos setores, incluindo comércio, indústria e agropecuária, e ainda
não há uma perspectiva sobre quando essas perdas serão recuperadas.
Entrega de produtos é 40% menor dos Correios
O número de encomendas entregues, em todo o País, pelos Correios na
última sexta-feira (25) foi cerca de 40% menor em relação a um dia
normal. De acordo o órgão, isso ocorreu "porque os caminhões não
conseguiram chegar ao seu destino em razão de bloqueios nas estradas ou
devido à falta de combustível".
Segundo os Correios, apenas os serviços com dia e hora marcados, como
Sedex 10, Sedex 12 e Sedex Hoje, estão temporariamente suspensos devido à
paralisação dos caminhoneiros.
"Os Correios lembram que estão aceitando normalmente a postagem de
cartas e encomendas (Sedex convencional e PAC), porém os prazos de
entrega desses serviços foram ampliados", disse, em nota.
Atrasos
A empresa esclareceu que os objetos que já se encontravam nos centros
de distribuição estão sendo entregues normalmente. "Quanto aos objetos
em trânsito ou que estavam na origem quando a greve se iniciou, ainda
não é possível mensurar, com precisão, o tempo de atraso, pois dependerá
do período que durar a paralisação dos caminhoneiros", acrescentou em
nota.
Faturamento de lojas cai até 50% em 8 dias
Embora apoie a reivindicação dos caminhoneiros, tendo em vista o
contínuo e "exorbitante" aumento dos preços dos combustíveis em todo o
Brasil, o presidente do Sindicato dos Lojistas de Fortaleza
(Sindilojas), Cid Alves, revela que as lojas físicas da Cidade estão
sofrendo uma queda significativa no movimento.
Em oito dias, calcula, o faturamento das vendas caiu pela metade, se
comparado a igual período sem greve. Mesmo quando as paralisações
encerrarem, estima que as mercadorias só devem voltar às prateleiras em
um prazo médio de uma semana. "Muitas pessoas já encheram as despensas e
materiais de construção, confecção e calçados ficam à margem da
prioridade".
Quanto aos preços dos produtos no varejo, Cid Alves não espera novas
altas. Até porque a população, cuja capacidade contributiva está
esgotada, já não suporta mais outros novos gastos. "Se eu aumento o
preço do produto, ele fica fora da possibilidade de consumo, parado. Se
subo e meu concorrente não, eu não vendo e ainda levo a fama de
careiro". Ele vislumbra um alívio ao bolso do consumidor, dada a
diminuição de R$ 0,46 no litro do diesel, conforme previsto pelo governo
federal. "Preços praticados em setores como autopeças e
eletrodomésticos vão cair com a redução no diesel".
Compras adiadas
Temendo não ter como voltar para casa e priorizando adquirir produtos
de primeira necessidade, muitos consumidores estão deixando as compras
de roupas e outros itens no varejo para depois. É o que avalia o
presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de Fortaleza (CDL de
Fortaleza), Assis Cavalcante.
Itens sazonais represados
De acordo com ele, a principal preocupação dos lojistas é com relação à
proximidade de datas significativas em vendas para o comércio como o
Dia dos Namorados, a Copa do Mundo e o São João. "Existem produtos
sazonais, como camisas da seleção brasileira e artigos de São João, que
são vendidos somente nestas datas. Então, estamos apreensivos. Já
notamos uma retração nas vendas e no fluxo", admite. Ele nega boatos que
as lojas possam vir a fechar e diz que os estoques atuais vão garantir o
consumo até quarta-feira (30).
Repasse inevitável
Quanto ao repasse dos prejuízos do varejista ao consumidor, Assis
Cavalcante diz ser inevitável. "Se a população está precisando e os
produtos estão faltando, certamente quem vai comprar vai comprar mais
caro. Isto porque na cadeia produtiva o lojista vai comprar por preço
mais alto e naturalmente vai ter que repassar". O presidente da CDL de
Fortaleza reforça que, ao menor sinal de dificuldade, o consumidor logo
se retrai. Mas estima um fluxo normal dentro de 4 a 5 dias após o fim da
greve.
19 itens na Ceasa estão mais caros
Com a continuidade da greve dos caminhoneiros, chegando hoje ao nono
dia, o abastecimento de diversos setores está limitado ou até mesmo
inexistente. Os comerciantes das Centrais de Abastecimento do Ceará
(Ceasa-CE) já registram prejuízo que chega a 60% do que seria faturado
nesses oito dias de paralisação, segundo Odálio Girão, analista de
mercado da Ceasa.
"Há comerciantes que já perderam seis caminhões de mercadoria na
estrada. Esse percentual de perda já é muito alto para o porte de
comerciantes que nós temos", afirma. Ele acrescenta que em todos esses
dias, o local não recebeu nenhum caminhão de outros estados. "Temos
recebido somente os produtores locais, do Maciço de Baturité, litoral
leste e oeste perto de Fortaleza", pontua. Ressalta que, apesar de
estarem chegando alguns produtos regionais, a quantidade ainda é
insuficiente.
Oferta mínima
"Temos recebido uma ou duas carradas, mas ainda é pouco, acaba muito
rápido", diz Girão. Produtos como uva, morango, abacate e maçã nacional
já estão em falta no mercado. "Esse prejuízo não é só para os produtores
nem para os comerciantes, chega até o consumidor também, que paga mais
caro devido a pouca oferta", destaca. Dos 27 itens que têm os preços
monitorados diariamente na Ceasa, 19 apresentaram elevação ontem (28). O
campeão no aumento dos valores continua sendo a batata-inglesa, cujo
quilo está custando R$ 9,00, alta de 221,43% em relação ao mês passado. O
quilo do tomate longa vida também foi destaque, subindo 87,5% e
chegando a R$ 6,00 contra R$ 3,20 registrado em abril. "Para uma
segunda-feira normal, eram esperados 300 caminhões com mercadoria, todos
vindos de outros estados, mas até agora não recebemos nenhum e nem há
expectativa de que chegue", destaca Odálio. Em um mês, são
comercializadas cerca de 50 mil toneladas de produtos na Ceasa.
Prazo de normalização
Odálio afirma que se a greve terminasse hoje, o mercado estaria
recebendo novos produtos dentre de seis dias e estaria normalizado no
prazo de seis a dez dias. "Mas ainda não temos previsão de quando isso
vai acontecer, já que as barreiras continuam, principalmente nos estados
de Minas Gerais e Bahia", diz o analista de mercado da Ceasa.